Semana Informática 07 a 13 de Outubro de 2011
por Luísa Dâmaso
O plano estratégico de intervenção nos sistemas de informação e tecnologias continua a ser executado pela actual administração do hospital. O objectivo é optimizar internamente os processos e melhorar os cuidados de saúde prestados aos utentes
«A nossa vantagem competitiva,
enquanto cliente, é a forma como
estudamos o mercado e os
negócios e como concebemos o
modelo que pretendemos adquirir.»
A contenção de custos e a geração de poupanças nunca foram tão comentadas como agora. Mas há uma questão que se levanta em todos os sectores: o saldo proveniente dessas poupanças é aplicado em quê? Este é um ponto que não pode ser ignorado na hora de apresentar resultados, principalmente quanto estão em causa organizações da esfera pública. Luís Coelho, administrador, vogal executivo do Conselho de Administração do Hospital Infante D. Pedro, em Aveiro, deixa bem claro que este tópico é essencial em qualquer boa gestão, sendo completamente visível no Plano Estratégico de Intervenção (PEI) nos SITI que definiu para o Hospital Infante D. Pedro. «O dinheiro poupado é investido na modernização», atesta o responsável. Em entrevista ao Semana, o administrador fala dos últimos desenvolvimentos operados no campo tecnológico, nomeadamente no datacenter da instituição, que deverá satisfazer as necessidades da organização nos próximos seis anos e ter um custo mais reduzido, na ordem dos 30 mil euros ano.
Semana Informática – Um ano depois de anunciada a revolução nos sistemas e tecnologias de informação, o que se seguiu no plano estratégico de intervenção?
Luís Coelho – Na sequência do PEI ao nível dos SITI, o Hospital de Aveiro concluiu, ao fim de três anos, conforme previsto, a quinta etapa do plano, que consistiu essencialmente em três vectores. O primeiro comportou a substituição integral do datacenter; o segundo esteve relacionado com a instalação do PACS/RIS, uma vez que, até à data, a realização dos exames do foro radiológico
assentaram na velhinha película; e o último esteve associado à promoção da Rede Telemática da Saúde (RTS). Mais uma vez realço que, nesta área como numa qualquer outra, nada se consegue por acaso. Os recursos são escassos, a evolução tecnológica é permanente, as opções possíveis são muitas e
as nossas decisões têm necessariamente de ser estudadas e contextualizadas num plano e numa visão estratégica de médio e longo prazo.
S.I. – Em termos de datacenter, que evoluções foram concretizadas?
L.C. – No decorrer da substituição integral do datacenter optou-se por uma plataforma estrutural totalmente virtualizada, tendência que já tinha sido iniciada com os postos de trabalho em 2009. Esta evolução foi concretizada com base numa infra-estrutura de blades, quer na componente baseada em sistemas operativos Microsoft, quer na baseada em Unix. O reflexo foi significativo no aumento das capacidades de processamento, uma vez que passámos de 24 cores x 2 GHz para 32 cores x 2,9 GHz, bem como na memória disponível (de 48 GB de memória RAM passámos para 384 GB). Há outros benefícios adicionais que passámos a usufruir e que culminam num acréscimo de segurança de dados e de desempenho do sistema. Na recta final, o projecto obrigou-nos a proceder à migração total de VMware para outra solução de virtualização.
POUPANÇA ANUAL DE 30 MIL EUROS
S.I. –O que é que envolveu essa migração e porquê a mudança de tecnologia?
L.C. – Não foi tarefa fácil e o rigor da programação com a CPC e a HP foi excelente. Durante um mês mantivemos as duas plataformas a funcionar em paralelo de forma a, step by step, consolidarmos, com segurança, servidor a servidor, actualizando os sistemas operativos, redimensionando espaço em disco, aferindo a capacidade de processamento e a memória RAM disponível, para depois de repetidos e exaustivos testes, disponibilizarmos sem risco as novas plataformas aplicacionais.
A principal razão para esta mudança foi económica, tendo em vista as necessidades actuais e dos próximos seis anos.
Cremos que esta tecnologia conseguirá satisfazer plenamente as nossas carências com um custo mais reduzido, na ordem dos 30 mil euros ano.
S.I. –De quantos servidores virtualizados passam a dispor, e qual é a capacidade de storage?
L.C. – Nesta plataforma foram virtualizados 66 servidores. Actualmente, a nossa capacidade de armazenamento passou para 43000 GB estando com uma ocupação na ordem dos 33%.
Temos grande capacidade para absorver necessidades futuras e para continuar a garantir elevada disponibilidade.
Podemos crescer até aos 62%. O desempenho do sistema foi melhorado em 226%, ou seja, de 576 GB/hora passou para 1300 GB/hora. A capacidade da solução de armazenamento de dados passou de 8314 GB para aproximadamente 43000 GB, a erformance foi melhorada em 226%, de 576 GB por hora passou para 1300 GB por hora.
S.I. – Como decorreu o projecto de abandono da película nos meios complementares de diagnóstico?
L.C. – Depois de ter estudado, com rigor durante seis meses, as opções de mercado, o Hospital de Aveiro optou pela solução que considerou ser a mais equilibrada do ponto de vista do custo e da qualidade. A integração da solução de PACS da Agfa com a solução RIS da First pareceu-nos muito equilibrada. A implementação foi concretizada em dois meses; foi rápida e não fomos confrontados com qualquer problema que tivesse implicado qualquer atraso. O único problema que neste momento persiste, e que é geral nestes sistemas, é a utilização eficiente do sistema de voz, que, como todos reconhecemos, obriga a um processo de aprendizagem demorado e que só dá frutos a longo prazo. Mais difícil do que a implementação foi conceber um modelo de negócio para as duas áreas, com dois fornecedores diferentes, que fosse fechado e não permitisse qualquer surpresa futura quanto aos custos da solução global. Nesta área como em qualquer outra, a nossa vantagem competitiva, enquanto cliente, é a forma como estudamos o mercado e os negócios e como concebemos o modelo que pretendemos adquirir.
Finalmente, podemos dizer que em Aveiro já não existe película. Todo o processo se encontra digitalizado, com uma melhoria qualitativa inquestionável.
MAIS INFORMAÇÃO PARA O DIAGNÓSTICO
S.I. – No último mês, a vossa iniciativa pró-inovação foi muito falada, nomeadamente em relação à Rede Telemática da Saúde. Em que consiste este projecto?
L.C. – A Rede Telemática da Saúde (RTS) foi um projecto desenvolvido na sequência do programa Aveiro Digital, com um investimento total de 900 mil euros e financiado a 70% pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) e pelo Fundo Social Europeu (FSE) FEDER/FSE, no âmbito do Programa Operacional para a Sociedade da Informação (POSI). O seu desenvolvimento, dado como concluído em 2006, teve a participação integrada dos centros de saúde do Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) do Baixo Vouga I e II, do Hospital de Águeda e do Hospital Infante Dom Pedro, como líder do projecto, e da Universidade de Aveiro, como parceiro tecnológico estratégico.
Desde 2006, por vários motivos, principalmente alguma confusão quanto à sobreposição das suas finalidades com outras soluções (nomeadamente o AlertP1) que foram sendo implementadas, não lhe foi dado uso, e o processo esteve todo este tempo arquivado.
O nosso mérito neste processo foi apenas a determinação de lhe dar corpo, divulgar a sua utilização e, assim, permitir que se tirasse proveito de todo um investimento que foi realizado e do benefício potencial que a solução permite.
S.I. – Em que consiste esta reanimação da RTS?
L.C. – A RTS é uma solução que assenta numa lógica de integração de informação clínica. Além de outras funcionalidades, torna acessível aos profissionais (médicos, neste momento) o histórico de um utente relativo a todos os episódios registados em cada uma das instituições por onde passou, ordenados por antiguidade e, em cada um destes episódios, à informação clínica, às cartas de alta, aos resultados de análises e exames, aos relatórios e prescrições de medicamentos, entre outros. Desta forma, passa a ficar disponível, para a comunidade médica da região de Aveiro, mais informação para o diagnóstico, prognóstico
e seguimento dos utentes, estando criadas condições para evitar possíveis duplicações de prescrições de análises e exames, para disponibilizar resultados das análises que desde 9 de
Setembro o Hospital de Aveiro passou a fazer para os centros de saúde, e para facilitar a comunicação entre os profissionais das várias instituições, através de outra funcionalidade do sistema, que é a possibilidade de troca de mensagens dentro da plataforma.
S.I. – Tendo em conta que a informação clínica envolve sempre muito papel, como articularam a integração dos documentos já existentes na RTS?
L.C. – Neste momento, a RTS integra um total aproximado de 18 milhões de episódios de consulta, urgência, hospital de dia, internamento, entre muitos outros, efectivados em cada uma das unidades, e consolida para cada um desses episódios os registos clínicos disponíveis no sistema de cada unidade. Por condicionalismos associados à largura de banda da RIS, só
é possível transaccionar texto livre, mas logo que esta limitação esteja ultrapassada poderemos partilhar outro tipo de informação com características multimédia.
A manutenção do papel para alguns registos vai continuar a coexistir. Mas também sabemos que da parte dos profissionais de saúde há consciência plena da vantagem e da utilidade dos registos electrónicos.
É por isso que, por uma questão de rigor, se deverá utilizar a expressão registo clínico electrónico e não processo clínico.
S.I. – Tecnologicamente, o que é que foi necessário mudar nas várias unidades envolvidas?
L.C. – Pouco foi preciso fazer, quase diria que apenas criar rotas e acessos a base de dados, colocando servidores, com serviços de pesquisa de ponteiros e wraping. A interactividade entre as várias unidades de saúde assentou numa tecnologia totalmente SOAP e webservices, desenvolvida em Java com ferramentas open source e com um sistema Operativo Linux para os servidores e uma base de dados SQL.
GENERALIZAR A UTILIZAÇÃO
S.I. – Além dos mecanismos de segurança já patentes na Intranet do Ministério da Saúde, são utilizados outros recursos extra para garantir a confidencialidade dos dados ou a integridade dos acessos?
L.C. – A questão da segurança num sistema deste tipo é preponderante. Mas desde logo interessa evidenciar que o acesso à RTS é restrito à RIS (Intranet do Ministério da Saúde). Ainda assim, a RTS possui mecanismos próprios de segurança, adicionais à “segurança” habitual exigida pela RIS, embora esteja previsto desenvolver outros mecanismos de segurança que permitam o acesso a partir da Internet (fora da RIS).
S.I. – Já é possível fazer um primeiro balanço desta nova realidade tecnológica existente na rede de organismos de saúde da região de Aveiro?
L.C. – Eu diria que a satisfação dos profissionais é elevada, e não se poderia esperar outra coisa. Mas ainda é muito cedo para fazer balanços. Pensamos que será necessário deixar correr um período de seis meses para depois iniciarmos um processo de avaliação. Nesta fase, a nossa preocupação tem sido potenciar a sua utilização, aumentando diariamente o número de utilizadores e resolvendo alguns problemas pontuais que vão surgindo.
S.I. – O que é que pensa que poderá ser o futuro desta solução?
L.C. – A plataforma tem vindo a sofrer diversas e sucessivas melhorias pontuais e está muito longe de conseguir disponibilizar todo o seu elevado potencial.
Apesar de facilmente lhe reconhecermos as virtudes de uma ideia inovadora, pioneira, que em muito honra a região de Aveiro, e o Hospital em particular, estão já identificados os próximos passos estratégicos. Desde logo, está previsto alargar a sua utilização aos restantes centros de saúde, passar a disponibilizar imagens dos exames radiológicos, bem como passar a informação sobre a medicação em regime de internamento. A obtenção da autorização
da Comissão Nacional de Protecção de Dados para a utilização de um módulo (já disponível) e destinado ao utente está também nos planos.
Mas mais importante do que qualquer um destes passos será, necessariamente, a concretização duma qualquer expectativa de ver a RTS como uma solução nacional, para além da região de Aveiro e até além-fronteiras. E não é um sonho, é uma realidade cada vez mais próxima.
Aliás, já está a ser gerida centralmente pela ACSS a integração da RTS num projecto de dimensão europeia designado EPSOS, e que no fundo visa alargar este conceito a uma escala, além-fronteiras.